A ocultação das possibilidades de unificação das polícias passa na
maioria da vezes pelo lobby dos portadores de altos cargos, principalmente de
oficiais de alta patente das policias estaduais, que relutam em mudar o já
desgastado modelo de atendimento a população.
A mudança para uma estrutura de Polícias Estaduais e uma conseqüente
desmilitarização da Polícia Militar é debatida entre especialistas em segurança
pública.
Mudar a Constituição Federal é fundamental, através de uma emenda será
possível a unificação dos currículos de formação dos policiais, bem como dos
seus procedimentos.
A PEC 102 (Projeto de Emenda Constitucional) de 2011, de autoria do
Senador Blairo Maggi (PR/MT) que busca a unificação das polícias.
Túlio Vianna, professor de direito penal da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG), fala sobre os problemas atuais do modelo de polícia
militar no Brasil e o que temos a ganhar com a desmilitarização.
O prof. Túlio falar especificamente sobre a PEC 102, que autorizaria
estados a fundir suas polícias em uma única corporação civil.
Veja as explicações no link: http://www.youtube.com/watch?v=Rh48PjJnpZs
Mas há aqueles que afirmam que a desmilitarização já aconteceria se
acabasse a pressão sobre os policiais para que atuem como militares em guerra,
vertente apoiada por muitos.
No link abaixo, veja o entendimento dos prejuízos trazidos aos policiais
militares e conseqüentemente a própria população, com este modelo que já é
considerado por vários especialistas em segurança publica, como sendo arcaico e
que não atende ao interesse publico, missão principal da administração publica
brasileira.
O General do Exército Adriano Pereira Junior, Comandante da Força de
Ocupação do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro.
Veja também um debate sobre a desmilitarização e seus prós e contras.
O Conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de
Lima considera que o modelo ideal é a mudança constitucional, que permitiria
que apenas uma instituição policial pudesse ser responsável pela segurança.
Ele observa, porém, que poderia haver algumas mudanças independentemente
da alteração da Carta, como uma maior transparência das polícias e mais diálogo
com a sociedade. Em julho, os integrantes do Fórum publicaram a Carta de
Cuiabá, na qual apresentam dez medidas a serem tomadas para reformar a polícia,
entre elas a desmilitarização.
— Toda democracia precisa de uma polícia forte, mas uma polícia forte
não é uma polícia violenta. A reação das polícias durante os protestos mostra
que precisamos rediscutir esses procedimentos. Mas, a meu ver, a visão
militarizada explica apenas um pedaço desse problema. Existem questões
administrativas e gerenciais que também influenciam esse comportamento.
Para Michel Misse, coordenador do Núcleo de Estudos em Cidadania,
Conflito e Violência Urbana da UFRJ, a mudança começa pela alteração da
Constituição:
— A polícia precisa ter uma formação mais cidadã. Para isso, é preciso
desmilitarizar, tirar o caráter militar que predomina na corporação. Isso
permitiria unificar o currículo de formação. A unificação permitiria termos uma
única polícia. No mundo inteiro é assim. Uma única polícia faz o policiamento
de rua, produz o relatório sobre as suas investigações e o manda para o
Ministério Público — explica.
Ex-secretário estadual de Direitos Humanos e professor de ciências
sociais da Uerj, o coronel reformado Jorge da Silva aponta outra questão. Para
ele, a desmilitarização da polícia deve ocorrer tanto entre os policiais
militares quanto entre os policiais civis. Silva diz que a cultura
militarizada, que leva o policial a atuar como se estivesse combatendo um inimigo,
existe nas duas corporações.
— Não é mudando uma lei que você acaba com a militarização, porque esse
é um modelo que é praticado nas duas polícias. Ou seja, não é o nome da polícia
que define a sua forma de ação. A meu ver, só vamos acabar com a militarização
na Civil e na Militar se também a sociedade e o poder público acabarem com a
pressão para que os policiais atuem como militares em determinadas áreas da
cidade, especialmente as pobres. Essa pressão para que eles combatam inimigos
repercute em toda corporação. Quando eles vão para rua, vão com essa missão.
O Professor Túlio Vianna em um artigo publicado na revista fórum faz um
esboço do velho modelo adotado pelo Brasil.
Uma das heranças mais malditas que a ditadura militar nos deixou é a
dificuldade que os brasileiros têm de distinguir entre as funções das nossas
Forças de Segurança (polícias) e as das nossas Forças Armadas (exército,
marinha, aeronáutica). A diferença é muito simples: as Forças de Segurança
garantem a segurança interna do Estado, enquanto as Forças Armadas garantem a
segurança externa. Polícias reprimem criminosos e forças armadas combatem
exércitos estrangeiros nos casos de guerra.
Diante das desmensuradas diferenças de funções existentes entre as
Forças de Segurança e as Forças Armadas, é natural que seus membros recebam
treinamento completamente diferente. Os integrantes das Forças Armadas são
treinados para enfrentar um inimigo externo em casos de guerra. Nessas
circunstâncias, tudo que se espera dos militares é que matem os inimigos e
protejam o território nacional. Na guerra, os prisioneiros são uma exceção e a
morte é a regra.
As polícias, por outro lado, só deveriam matar nos casos extremos de
legítima defesa própria ou de terceiro. Seu treinamento não é para combater um
inimigo, mas para neutralizar ações criminosas praticadas por cidadãos
brasileiros (ou por estrangeiros que estejam por aqui), que deverão ser
julgados por um poder próprio da República: o Judiciário. Em suma: enquanto os
exércitos são treinados para matar o inimigo, polícias são treinadas para
prender cidadãos. Diferença nada sutil, mas que precisa sempre ser lembrada,
pois muitas vezes é esquecida ou simplesmente ignorada, como na intervenção no
Complexo do Alemão na cidade do Rio de Janeiro ou em tantas outras operações na
qual o exército tem sido convocado para combater civis brasileiros.
O militarismo se justifica pelas circunstâncias extremas de uma guerra,
quando a disciplina e a hierarquia militares são essenciais para manter a
coesão da tropa. O foco do treinamento militar é centrado na obediência e na
submissão, pois só com estas se convence um ser humano a enfrentar um exército
inimigo, mesmo em circunstâncias adversas, sem abandonar o campo de batalha. Os
recrutas são submetidos a constrangimentos e humilhações que acabam por
destituí-los de seus próprios direitos fundamentais. E se o treinamento militar
é capaz de convencer um soldado a se deixar tratar como um objeto na mão de seu
comandante, é natural também que esse soldado trate seus inimigos como objetos
cujas vidas podem ser sacrificadas impunemente em nome da sua bandeira.
A sociedade reclama do tratamento brutal da polícia, mas insiste em dar
treinamento militar aos policiais, reforçando neles, a todo momento, os valores
de disciplina e hierarquia, quando deveria ensiná-los a importância do respeito
ao Direito e à cidadania. Se um policial militar foi condicionado a respeitar
seus superiores sem contestá-los, como exigir dele que não prenda por “desacato
à autoridade” um civil que “ousou” exigir seus direitos durante uma abordagem
policial? Se queremos uma polícia que trate suspeitos e criminosos como
cidadãos, é preciso que o policial também seja treinado e tratado como civil
(que, ao pé da letra, significa justamente ser cidadão).
O treinamento militarizado da polícia brasileira se reflete em seu
número de homicídios. A Polícia Militar de São Paulo mata quase nove vezes mais
do que todas as polícias dos EUA, que são formadas exclusivamente por civis.
Segundo levantamento do jornal Folha de S. Paulo divulgado em julho deste ano,
“de 2006 a 2010, 2.262 pessoas foram mortas após supostos confrontos com PMs
paulistas. Nos EUA, no mesmo período, conforme dados do FBI, foram 1.963
‘homicídios justificados’, o equivalente às resistências seguidas de morte
registradas no estado de São Paulo”.Neste estado, são 5,51 mortos pela polícia
a cada 100 mil habitantes, enquanto o índice dos EUA é de 0,63 .
Uma diferença
bastante significativa, mas que, obviamente, não pode ser explicada
exclusivamente pela militarização da nossa polícia. Não obstante outros fatores
que precisam ser levados em conta, é certo, porém, que o treinamento e a
filosofia militar da PM brasileira são responsáveis por boa parte desses
homicídios.
Nossa Polícia Militar é uma distorção dos principais modelos de polícia
do mundo. Muitos países europeus possuem gendarmarias, que são forças militares
com funções de polícia no âmbito da população civil, como a Gendarmerie
Nationale na França, os Carabinieri na Itália, a Guardia Civil na Espanha e a
Guarda Nacional Republicana em Portugal. As gendarmarias, porém, são bem
diferentes da nossa Polícia Militar, a começar pelo fato de serem nacionais, e
não estaduais.
Em geral, as atribuições de policiamento das gendarmarias
europeias se restringem a áreas rurais, cabendo às polícias civis o
policiamento, tanto ostensivo como investigativo, das áreas urbanas, o que
restringe bastante o âmbito de atuação dos militares. As gendarmarias europeias
também são polícias de ciclo completo, isto é, realizam não só o policiamento
ostensivo, mas também são responsáveis pela investigação policial.
No Brasil, a Constituição da República estabeleceu no seu artigo 144 uma
excêntrica divisão de tarefas, na qual cabe à Polícia Militar realizar o
policiamento ostensivo, enquanto resta à Polícia Civil a investigação policial.
Esta existência de duas polícias, por óbvio, não só aumenta em muito os custos
para os cofres públicos que precisam manter uma dupla infraestrutura policial,
mas também cria uma rivalidade desnecessária entre os colegas policiais que
seguem duas carreiras completamente distintas.
O jovem que deseja se tornar
policial hoje precisa optar de antemão entre seguir a carreira de policial
ostensivo (militar) ou investigativo (civil), criando um abismo entre cargos
que seriam visivelmente de uma mesma carreira.
Nos EUA, na Inglaterra e em outros países que adotam o sistema
anglo-saxão, as polícias são compostas exclusivamente por civis e são de ciclo
completo, isto é, o policial ingressa na carreira para realizar funções de
policiamento ostensivo e, com o passar do tempo, pode optar pela progressão
para os setores de investigação na mesma polícia.
Para que se tenha uma ideia
de como esse sistema funciona, um policial no Departamento de Polícia de Nova
York (NYPD) ingressa na carreira como agente policial (police officer) para
exercer atividades de polícia ostensiva (uniformizado), tais como responder
chamadas, patrulhar, perseguir criminosos etc. Depois de alguns anos, esse
agente policial pode postular sua progressão na carreira para o cargo de
detetive (detective) no qual passará a exercer funções investigativas e não
mais usará uniformes. A carreira segue com os cargos de sargento (sergeant),
que chefia outros policiais; de tenente (lieutenant), que coordena os sargentos;
e de capitão (captain), que comanda o que chamaríamos de delegacia.
Apesar do que a semelhança dos nomes poderia sugerir, não se trata de
patentes, mas de cargos, pois todos são funcionários públicos civis. Cada
policial está subordinado apenas a seus superiores hierárquicos em linha
direta, assim como um escrivão judicial brasileiro está subordinado ao juiz com
o qual trabalha. Um agente policial estadunidense não está subordinado de
qualquer forma às ordens de um capitão de uma unidade policial que não é a sua,
assim como o escrivão judicial brasileiro não deve qualquer obediência a juízes
de outras varas. Para se ter uma ideia da importância dessa diferença, basta
imaginar a situação difícil em que fica um policial militar brasileiro ao
parar, em uma blitz, um capitão a quem, para início de conversa, tem o dever de
prestar continência. A hierarquia militar acaba funcionando, em casos como
esse, como uma blindagem para os oficiais, em um nítido prejuízo para o
princípio republicano da igualdade de tratamento nos serviços públicos.
As vantagens de uma polícia exclusivamente civil são muitas e, se
somadas, a unificação das polícias ostensiva e investigativa em uma única
corporação de ciclo completo só traz benefícios para os policiais, em termos de
uma carreira mais atrativa, e aos cidadãos, com um policiamento único e mais
funcional.
No Brasil, tramita no Senado da República a Proposta de Emenda à
Constituição nº 102/2011, de autoria do senador Blairo Maggi (PR/MT), que, se
aprovada, permitirá aos estados unificarem suas polícias em uma única
corporação civil de âmbito estadual, representando um avanço imensurável na
política de segurança pública brasileira, além de uma melhor aplicação do
dinheiro público, que não mais terá que sustentar duas infraestruturas
policiais distintas e, algumas vezes, até mesmo concorrentes.
A unificação das polícias também possibilitaria uma carreira policial
bem mais racional do que a que temos hoje. O policiamento ostensivo é bastante
desgastante e é comum que, à medida que o policial militar envelhece, ele acabe
sendo designado para atividades que exijam menor vigor físico. Como atualmente
existem duas polícias e, portanto, duas carreiras policiais distintas, os
policiais militares acabam sendo designados para tarefas internas, típicas de
auxiliar administrativo, mas permanecem recebendo a mesma remuneração de seus
colegas que arriscam suas vidas nas ruas.
Com a unificação, ocorreria o que
acontece na maioria das polícias do mundo: ele seria promovido para o cargo de
detetive e sua experiência como policial ostensivo seria muito bem aproveitada
na fase de investigação. Para suprir os cargos administrativos meramente
burocráticos, bastaria fazer concursos para auxiliares administrativos que
requerem vocação, habilidades e treinamento bem mais simples daqueles exigidos
de um policial.
Por outro lado, os policiais civis que realizam o trabalho de
investigação atualmente são recrutados por meio de concursos públicos e começam
a exercer suas atividades investigativas sem nunca terem tido experiência
policial nas ruas. Com a unificação da polícia, o ingresso se daria sempre para
o cargo de policiamento ostensivo, no qual o policial ganharia experiência e só
então poderia ascender na carreira para os cargos de investigação. Um modelo
que privilegia a experiência prática, e não o conhecimento técnico normalmente
exigido em provas de concursos.
Finalmente, a unificação das polícias acabaria também com os julgamentos
de policiais pela Justiça Militar. Pelo atual sistema, os crimes praticados por
policiais militares em serviço (exceto crimes dolosos contra a vida de civis)
são julgados não pelo juiz criminal comum, mas pela Justiça Militar, em uma
clara violação do princípio republicano da isonomia. É como se as universidades
federais tivessem uma Justiça Universitária para julgar os crimes praticados
por professores durante as aulas; ou as indústrias tivessem uma Justiça
Industrial para julgar os crimes praticados por metalúrgicos em serviço. Uma
espécie de universo paralelo jurídico que só se explica pela força política dos
militares quando da promulgação da Constituição de 1988.
Desmilitarizar e unificar as polícias estaduais brasileiras é uma
necessidade urgente para que haja avanços reais na nossa política de segurança
pública. Vê-se muito destaque na mídia para projetos legislativos que
demagogicamente propõem o aumento de penas e outras alterações nos nossos
códigos Penal e de Processo Penal como panaceia para o problema da
criminalidade. Muito pouco se vê, porém, quanto a propostas que visem a
repensar a polícia brasileira.
De nada adianta mudar a lei penal e processual penal se não se alterar a
cultura militarista dos seus principais aplicadores. Treinem a polícia como
militares e eles tratarão todo e qualquer suspeito como um militar inimigo.
Treinem a polícia como cidadãos e eles reconhecerão o suspeito não como “o outro”,
mas como alguém com os seus mesmos direitos e deveres. Nossa polícia só será
verdadeiramente cidadã quando reconhecer e tratar seus próprios policiais como
civis dotados dos mesmos direitos e deveres do povo para o qual trabalha.
2 comentários:
A sociedade exige eficiência no trabalho das polícias.
OS MILITARES SÃO VÍTIMAS DE UM REGIME DE DITADORA E ARCAICO, SÃO TREINADO COMO ANIMAIS E SEM DIREITOS, SENDO ALVO DE ABUSO DE PODER NOS QUARTÉIS. E ASSIM TUDO QUE ELE APRENDE E PASSA É REPASSADO PARA A SOCIEDADE. ENTÃO É PRECISO PRIMEIRAMENTE DESMILITARIZAR E PREPARAR O HOMEM PARA SER UM PROFISSIONAL DE SEGURANÇA.
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