quarta-feira, 5 de setembro de 2012

OS EFEITOS DA FALTA DE PROMOÇÃO EM UMA CARREIRA POLICIAL

Por Danilo Ferreira via Abordagem Policial


Todas as polícias brasileiras fazem parte do grupo de instituições públicas com o funcionalismo organizado em carreira, o que significa que todos os policiais possuem – em tese – a perspectiva de galgar postos, graduações ou classes que garantam uma evolução financeira e funcional à medida que seu tempo de serviço aumenta. Diferentemente do mero “emprego”, onde o trabalhador geralmente se mantém visando apenas algumas necessidades imediatas de sobrevivência, a carreira privilegia a convivência do servidor com a organização a que pertence, dado o horizonte de crescimento do indivíduo no interior da instituição.
O problema é que, em algumas polícias brasileiras, esta diferenciação entre carreira e emprego parece não mais existir, dado que, desde o início de suas trajetórias, muitos profissionais já vislumbram certo “engarrafamento” que lhe impedirá a progressão funcional. Geralmente por descumprimento do que manda a lei e por excesso de considerações políticas, sem falar na sanha de “corte de gastos” que geralmente acomete o Estado (sempre do “lado mais fraco”), promoções deixam de ocorrer, com efeitos tenebrosos para as corporações policiais:

A monotonia da função

Embora muitas pessoas passem anos a fio com a mesma rotina no seu dia-a-dia, dificilmente se dirá que alguém com este perfil consegue ser inovador, dinâmico e versátil no que faz. A falta de perspectiva de crescimento funcional garante ao policial o estereótipo do que ficou definido pelo imaginário popular como “funcionário público”: um burocrata repetitivo, receoso de mudanças e inovações, imerso na monotonia de suas práticas, conhecidas e mantidas há muito tempo.

O sentimento de injustiça

Quando está na lei que o policial irá ser promovido em dada altura de sua carreira, e esta promoção não ocorre, consolida-se aí uma frustração, que gera o sentimento de injustiça, que por sua vez será convertido em desmotivação e prejuízo ao serviço prestado. É parte essencial do ser humano projetar o futuro, e não há aquele que desconsidera uma possibilidade de ascensão profissional quando vem preenchendo todos os requisitos para este movimento.

O descompasso institucional

Se um policial com a função “B” é responsável pela fiscalização do policial com a função “C”, e de repente aquele primeiro é promovido enquanto o “C” permanece no mesmo grau, mesmo preenchendo os requisitos para a promoção, a tendência é que as engrenagens da corporação policial comecem a se desgastar. Este tipo de desarmonia afeta fortemente os mecanismos de controle e gestão de qualquer administração.

As recompensas desviantes

Muitas vezes, visando compensar a falta de promoção, que se bem aplicada garante dignidade profissional a uma categoria, expedientes informais são adotados, principalmente em se tratando de nomeações e exonerações em cargos comissionados ou mesmo de direcionamento a funções menos “desgastantes”. É como se a corporação vivesse se desculpando por suas falhas aos policiais que, pouco reconhecidos conforme prevê a lei, acabam se agarrando a benesses passageiras e instáveis, distribuídas a partir de critérios duvidosos.

O desapego

Existe um sentimento de “posse” que é fundamental ao bom relacionamento entre o profissional e a organização em que trabalha. Não se trata da mesma posse que rege as relações da propriedade privada, mas aquela que garante certo cuidado do servidor público com a estrutura e os serviços sob sua responsabilidade. Ao perceber que está sendo preterido por motivos ilegítimos, a tendência é que o profissional abdique deste sentimento de intimidade e identidade com o que é público.

Neste contexto, onde o profissional é tratado como empregado, e não como funcionário de carreira, cobra-se o empenho e a dedicação proporcional a este último status, ao tempo em que se critica aqueles que mantêm uma relação proporcionalmente indiferente com sua corporação. Sem justificar desvios de conduta nem omissões, é de se questionar por que os profissionais, individualmente, são os responsáveis por compensar distorções orgânicas e estratégicas das instituições a que servem…

Danillo Ferreira é Tenente da Polícia Militar da Bahia, associado ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública e graduando em Filosofia pela UEFS-BA.

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